quarta-feira, 30 de abril de 2008

Londres congela - e não é de frio

18h24 de uma quarta-feira. Há um ano, eu estaria em plena reunião de pauta, relatando o fechamento de um caderno e prestes a começar a finalização da edição de uma revista. "Quartas são quartas", eu dizia, para justificar a ausência para amado, amigos, família, fontes, assessores.

Pois nesta quarta-feira, às 18h24, eu estava fazendo hora na Liverpool Street Station. Na flexibilidade da minha vida de estudante, me dei um intervalo no encerramento de dois trabalhos para testemunhar um mob*.

Precisamente nessa hora, dezenas de pessoas “congelaram” por quatro minutos, fazendo poses ora corriqueiras, ora inusitadas. Eis o Freeze London.


DR em plena estação de trem

Venta muito nessa cidade, sabe como é



“What the fxxx is that?”, se perguntava um senhor com jeitão inglês. Não era o único. Para quem participa dos eventos Freeze, parte da graça é deixar as pessoas pensando o que danado está acontecendo ali.

Depois dos quatro minutos, performers e público aplaudiram, e eu voltei pra universidade, que pra estudo não tem noite, madrugada, fim de semana ou feriado.



* Para saber mais sobre mobs, clique aqui (em português) ou aqui (mais detalhado, em inglês). Se tiver com preguiça e só quiser saber o minimo, mob é quando um monte de gente se reúne num lugar público para uma performance esquisita e depois se dispersa rapidamente.

** Para ver o Freeze London anterior , na Trafalgar Square, clique aqui.
** Para ver o Freeze Paris, clique aqui.
** Para ver o Freeze New York, clique aqui.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Shakespeare + ingresso de estudante = bolha

“Meus pés não estão me matando, estou bonita. Meus pés não estão me matando, estou bonita.”

Faz cinco dias que sofro por uma ousadia fashion. Tirei o salto alto do fundo do baú pra ir glamourosa para a abertura da temporada do teatro do Shakespeare, The Globe. Aniversário de nascimento e morte do bardo, Londres em festa com mil homenagens simultâneas. Sainha recém-chegada do Brasil e sandália que só usei um dia nessa temporada britânica. Tem uma estação de metrô do lado, pensei, o que podia dar errado?

Só que eu não sabia que tinha um passeio às margens do Tâmisa antes do espetáculo. Eu disse "passeio"? A caminhada era pra evitar que o grupo pegasse transporte público. Resultado do pseudo plano-perfeito-vida-de-estudante-no-exterior: agora tô com bolhas mil onde um dia deve ter sido a sola do meu pé.

Quem manda pirangar e ir pela excursão da universidade só porque era mais barato?

O dia estava lindo, é verdade, dispensei o casaco pela primeira vez em meses, é verdade, mas em vez de aproveitar a paisagem arrebatadora do centro da cidade, eu ficava aflita antecipando o que seria dos meus pés.

Pergunta: por que as pessoas acham que estudante gosta de andar? Tudo que é "pra estudante" envolve horas de caminhada!

Três horas e meia de espetáculo, com inglês arcaico e tudo, os colegas bocejando e eu feliz da vida, aliviada de estar sentada. Na hora do intervalo, o dilema: valia enfrentar o sacrifício de descer as escadas para um simples brinde oferecido pela excursão?

Ficava indelicado recusar. Respirei fundo e lá fui eu:

- Meus pés não estão me matando, estou bonita. Meus pés não estão me matando, estou bonita.


Insight pós-bolha: Agora eu sei por que já vi diversas pessoas trocando de sapato no metrô.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

I am too sexy for haute couture* ou como pagar 500 euros para ficar gorda

Missão do dia: com 100 euros no bolso me produzir inteira (vestido + acessórios) para ir a um casamento no campo na Normandia. Na minha cabeça, eu tinha um vestido ideal. Discreto, preto ou grafite de tafetá (eu ando muito tafetá).

Comecei minha missão por um bairro popular de confecções judaico-chinesas, o Sentier. Muitos problemas. A maioria das lojas só vende no atacado e os vestidos, digamos de festa, são de uma mau gosto incrível, as que aceitavam vender no varejo não tinham cabines e cada vestido era disputado quase a tapas por milhares de sacoleiras. Um horror.

Voltei pra casa desanimada. Me olhei bem no espelho, olhei pro catálogo das Galeries Lafayette e decidi encarar uma loja de departamentos realmente glamour.

Primeiro passo: camuflagem. Não dá para encarar Dior, Chanel e Prada com cara de estudante bolsista. Todo mundo é blasé em Paris, mas também não dá para exagerar e chegar com cara de passa-fome entregando que, para comprar o vestido da vitrine, seria obrigada a vender um rim.

Descobri o look ideal: despojada. All star, jeans, blusa preta, uma jóia discreta, porém verdadeira (o pessoal dessas lojas fareja folheado a ouro a quilômetros). E maquiagem, porque rico não tem olheiras.

Devidamente camuflada, fui para os braços do mundo fashion.

Dica importante: fazer cara de tédio para as coleções.

Muito importante: tocar a roupa apenas com a ponta dos dedos e fazer um longo suspiro com uma cara de boring. Na verdade, eu estava mesmo entediada. O que está acontecendo com essa temporada? Todos os vestidos seguem a mesma tendência de serem amplos. Ou seja, todos os vestidos parecem feitos sob medida para fazer a pobre moça se sentir um bujão de gás. Why? E o pior é ter que desembolsar 500 euros, em média, para ficar fantasiada de baiana. Até o manequim, que é basicamente uma armação de arame, parecia estar com culote com a roupa. Nem digo o efeito que o vestido corte trapézio cheio de babados me provocou.

Fui passando Chanel, Dior, Valentino, Marc Jacobs. Tudo me deprimia (pensamento de pobre: ainda bem que eu não tenho dinheiro mesmo, a coleção esta péssima). Cheguei a Miu Miu e vi um dos vestidos mais bonito de todos os tempos, marfim, lindo corte, mas nem ousei experimentar. Estava nítido que precisaria de 20 cm a mais, 20 quilos a menos e 2089 euros.
Passei para os sapatos e encontrei a felicidade.

Experimentei um par de sapatos Prada tão lindos que fiquei até mais magra. Dúvida: comprometo minha renda para ter que, literalmente, morar no sapatos?

terça-feira, 15 de abril de 2008

Minha primavera de 8 graus

Movimentei duas amigas queridas e recebi meu kit de sobrevivência para o verão londrino. Sim, a mala que eu trouxe inicialmente foi um erro. Prática e básica. E quem disse que eu sou prática e básica? Cadê as sainhas, os vestidos, os saltos? Ok, logo vi que as sandálias de salto alto ficam em desuso diante do tanto que se anda nessa cidade, mas mudar meu visual no início da temporada britânica comprometeu minha auto-estima. Não sou um ser de jeans e tênis, como me exigia a nova vida estudantil. Por isso o sucesso na comunidade internacional em momentos como dois posts abaixo. "Essa sou eu, não aquela que vocês conhecem", explico.

Pois foi só ver um solzinho tosco que vesti a sainha recém-chegada e fui desfilar. Claro que devidamente composta com meião de frio, blusa de manga comprida, cachecol e casaco. Friiiio.

Não demorei a encontrar um cara de chinelos enquanto eu tava andando toda encolhida.

Ai, que raiva.

Depois vi as meninas britânicas de minissaia ou minivestido sem meia por baixo.

Ai, que raiva.

O povo correndo de shortinho e camiseta.

Ai.

E eu mentalizando o conselho da Cíntia: "Não estou com frio, estou bonita. Não estou com frio, estou bonita".


Bônus (quase) científico da Cíntia:
Anos atrás quando morava em Nova York, li no NY Times que...
... casos extremos de hipotermia levam a um delírio e as pessoas começam a tirar a roupa. Na verdade, essas pessoas desinibidas em Londres não estão com calor, estão delirando. Pronto, Memel, tá explicado.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Conflitos diplomáticos

Uma das boas coisas de estudar no exterior é encontrar gente de todo o canto do mundo. Mas isso também cria uma obrigação meio chatinha de ter opinião formada sobre todos os países do globo.

Todo mundo tem alguma coisa para falar do Brasil ao conhecer a minha nacionalidade: "E o Lula?"; "Adoro o Ronaldinho" ."Acho que prefiro o Maradona ao Pelé". Você mora perto da cidade de Deus?" "O carnaval dura um mês inteiro?"

O problema é quando sou apresentada a alguém cuja localização do país é apenas vaga na minha memória. O que dizer para alguém que vem da Nova Caledônia? Níger? Ilhas da Reunião? Belize?Togo?

Mesmo quando eu sei onde fica o país, não tenho, necessariamente, mais nenhum comentário que não me faça passar por uma imbecil.

Há alguns que têm noção da pouca relevância mundial dos seus países e já vão falando: "No meu país é assim, assado". Mas tem gente que tem um certo sadismo de torturar o interlocutor.
No intervalo de uma conferência sobre pós-colonialismo na faculdade, vira um cara de Comores para mim e pergunta: "O que você sabe do meu país?". Assim, na lata. Parecia um daqueles programas de mau gosto de perguntas e respostas. E o pior que se cito que sou jornalista e/ou estudante de geopolítica aumenta a pressão social por frases definitivas sobre todo e qualquer país. Afe!

Felizmente recentemente a União Africana decidiu intervir nas Ilhas Comores para expulsar um ditador maluco que se autoproclamou soberano de uma parte da ilha. Não fosse isso, não teria absolutamente nada para dizer.

Diante de uma possível saia-justa, penso em recorrer a soluções alternativas:
a) apelar para frases vazias: "No gênero, nunca vi nada igual" (também serve para espetáculos em geral)
b) culpar a mídia pela falta de divulgação da vida no país x, y ...
c) repetir clichês: "Muitos mutilados em Angola, né?"
e) se for na balada, é mais fácil: "Ih, tá tocando a minha música"

Solução radical: o contra-clichê
A técnica consiste em gargalhar diante de qualquer frase. Ninguém vai achar que sou doida, vão simplesmente constatar a alegria do povo brasileiro "sempre alegre apesar das dificuldades".

Top Five: assuntos que necessitam de uma opinião formada. Sem um mínimo de conhecimento sobre esses assuntos, aqui na França não dá nem para conversar com o padeiro. Temas que animam qualquer rodinha de estudantes internacionais.
-Tibete e Dalai Lama
-Imigração clandestina
-Aquecimento global
-Queda do poder aquisitivo dos franceses
-"Lula ainda é de esquerda?"

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Confesso que dancei

Minha gente! Cheguei ao limite da degradação nacionalista na tentativa de proliferar os valores tupiniquins. Sambar ao som de La Bamba e Gipsy Kings tem perdão? Em minha defesa, a galera pediu. E eu, brasileira simpática, nao pude recusar. A Schnapps, diga-se, ajudou. Melissa





Eu nem tenho a desculpa do álcool. Dancei axé e funk voluntariamente diante de uma platéia de amigos internacionais e ainda ensinei grandes momentos coreográficos para uma amiga francesa que, agora, difunde o melhor da cultura brasileira em Pequim.
Joga a mão pra cima! Chão! Chão! Chão!

Cíntia

terça-feira, 1 de abril de 2008

Os de 20 atrás das de 30

Mocinhos de 20 e poucos estão se interessando por mocinhas de 30 e poucos. O 30 é o novo 20, mas nesse caso, o 20 não sabe que o 30 existe.

A gente explica. Invariavelmente os rapazes pensam que somos mais jovens. Um pouco mais velhas que eles, talvez, mas nunca depois dos 30. Ou seja, não se trata de um interesse juvenil por mulheres mais velhas, o que no imaginário das revistas e blogs femininos vem acompanhado de adjetivos como "experientes", "bem-resolvidas" e "que sabem o que quer"- não se enganem, a gente abomina essa relação míope de causa e efeito.

O fenômeno é internacional e precisa de estudo aprofundado. Amigas nossas têm até uma brincadeira pra isso. "Qual o seu piso?", e cada uma que confidencie a idade do rapaz mais jovem com que elas já, digamos, ficaram.

A complexidade feminina entra em cena também nessa área. Tem quem não ache nada demais, tem quem estabeleca um máximo de diferença como parâmetro aceitável e tem quem prefira rapazes mais velhos. Não é simples, mas é assim. Uma de nós não gosta da idéia de ficar com alguém que nasceu numa década depois da gente. Assim, até 1979 há alguma chance hipotética. A outra é mais flexível. Ah, também tem quem reveja os conceitos de vez em quando. Sim, temos direito a dias de metamorfose ambulante. Viva Raul.

Contam as mocinhas que essa interação com a juventude tem causado conflitos de experiência. Certo dia uma amiga nossa propôs um movimento menos óbvio na intimidade – ela jura que não era nada tão diferente assim – e ouviu um espantado "Isso aí eu nunca fiz isso antes". Descontado o charme do idioma estrangeiro, se o seu sonho de sedução não é ensinar nada a ninguém, o comentário pode atrapalhar, anh, a animação.

Outra amiga teve tempo para refazer mentalmente a lista de afazeres do dia seguinte enquanto o namoradinho sem muita experiência lutava para abrir o fecho de sua roupa íntima. "Por que você não ajudou o coitado?", perguntamos, sempre querendo dar uma forca pra galera. "Ele tem que aprender, ora", foi a resposta, antevendo a alegria da próxima mocinha com quem ele se deparasse. É por essas e outras que dizem que sempre entregamos para a próxima uma versão melhorada do homem que encontramos.

Para levantar o moral dos que estão começando na casa dos 20, registramos o relato de várias amigas com as boas surpresas que encontraram. Experiência nem sempre quer dizer qualidade e é por isso que existe uma lenda de que rapaz que chega aos 30 sem saber beijar não tem mais jeito. Há um caso, que achávamos raro, de perda de habilidade com o passar dos anos. Imperdoável. Atestado de incompetência em matéria de sedução.

(E antes que algum engraçadinho comente, a gente sabe que tem uma parcela que mente pra ver se "ganha" a mulherada. Mas esses são fáceis de identificar. Ou a gente se deixa enganar ; )


Bônus da Cíntia
: A importância das roupas "jovens"

Num raro dia de sol, saio de bermuda, tênis e baby look com estampa do Elvis. Sou abordada por um popular na que saía da escola. Isso aí, do segundo grau, aliás, ensino médio como se diz hoje em dia.

O ultrajovem começa com a conversinha. "Você estuda aqui por perto?" Eu explico que estudo na Paris 8. Ele faz uma cara de quase espanto e pergunta: "Quantos anos você tem?". Sem papas na língua, contei a minha verdade: "31". O menino, incrédulo: "Mentira, você está falando isso só para me dispensar". Sigo meu caminho sorridente.

Dois meses depois, com um vestido mais soltinho que eu julgava fashion-glamour anos 60, um jovem me chamou de senhora no metrô e me ofereceu um lugar para sentar. Hein?! Fiquei arrasada, mas sentei. O mocinho achou que eu era uma senhora de idade ou que estava grávida? Para reflexão.


Lição do dia
: Idade não é nada. Roupa é tudo. Mas atenção para não cair na caricatura de se fantasiar de jovem.


Melissa e Cíntia